segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Capítulo 24

- TEUSCHER -

De última hora Steffany havia mudado os planos. Eles não mais viajariam de avião partindo de Düsseldorf e nem tão pouco viajariam pela auto-estrada, o que seria muito arriscado. A dedução dela é que tudo estaria sendo vigiado.

Eles viajariam na lancha até certo ponto e de lá pegariam um táxi. Depois seguiriam viagem e procurariam fazer como tudo fora antes planejado.

Um telefonema de Georg confirmou tudo com os australianos e os russos. Eles já se encontravam em Zurique.

Os australianos não estavam gostando como as coisas estavam sendo resolvidas e fizeram ameaças. Georg diplomaticamente explicou que tudo isso era para medida de segurança. Parecia que eles haviam gostado de ouvir isso.

Passavam catorze minutos da meia-noite do dia cinco de fevereiro do ano 2000 quando o EC - D 203, o expresso noturno que vinha da Itália numa curva perto de Colônia, mais precisamente em Brühl, descarrilhou.

O maquinista vendo que ele iria de encontro a uma das casas da proximidade da linha férrea mais que depressa abriu a porta e saltou indo de encontro ao muro da casa batendo com as costas e perdendo os sentidos na mesma hora.

Um baque surdo encheu a noite escura e nebulosa.

O impacto do primeiro vagão com o muro da casa fez com que os próximos vagões fossem tombando um a um.

As pessoas que dormiam no trem não conseguiram perceber de imediato o que é que estava acontecendo. Tudo tinha sido alucinadamente rápido demais.

A sensação que tinham é que o mundo parecia ter chegado ao fim. As janelas do lado esquerdo dos vagões estavam voltadas para o chão. As pessoas que estavam sentadas daquele lado da janela ficaram bem machucadas.

Muitas pessoas pediam calma e iam ajudando umas as outras a se levantar e se apoiavam nas poltronas que agora estavam de lado e que servia de proteção.

Um homem de aproximadamente cinqüenta e poucos anos escalou a lateral de uma das janelas que agora apontava para o céu escuro e tentou sair.

Ele olhou para fora e disse:

- Santo Deus! Mas que diabos aconteceu aqui!?

Na neblina que cobria toda a noite ele viu um homem sair da fumaça, e gritou:

-Hei! Você aí, pode vir nos ajudar?

Não ouviu resposta e nem a pessoa se virou para ver quem gritava do trem pedindo ajuda. Simplesmente a silhueta sumiu na noite escura.

Teuscher e Kling viajavam no mesmo trem.

Eles embarcaram em Frankfurt, pois receberam informações pelo celular que nenhum grupo australiano e nenhum grupo vindos da Rússia embarcaram em Zurique e nem mesmo em outra estação da Suíça, quando o expresso fazia uma pequena pausa para a troca de maquinista.

Teuscher não se convencera da mensagem recebida e do seu carro dirigiu-se imediatamente para a estação de trem em Frankfurt. Alguma coisa nesta história não batia muito bem. A não ser que eles tivessem alterado os planos. E com isso ele teria que contar, é claro. Mas mesmo assim ele não iria desistir da única pista que tinha.

Ele ainda havia perguntado à polícia suíça se algum outro grupo de estrangeiros havia embarcado no trem. Eles responderam que os únicos estrangeiros foram uns ingleses, mas que seus passaportes estavam em ordem e em nada esse grupo se parecia com as fotos que lhes foram enviadas.

Teuscher achou muito estranho. Eles não poderiam ter tomado outro trem. Pelo que ele sabia toda a transação seria feita nesse trem, pois este era o único trem noturno naquele dia. Mas se esses ingleses portassem passaportes falsos? E se estivessem disfarçados? É claro que a polícia suíça não iria perceber, talvez nem ele mesmo. Por isso, Teuscher havia tomado uma outra decisão. Ele mesmo queria observar cada passageiro desse trem, o que isso não seria nada fácil na atual circunstância. Verificar cada rosto seria um verdadeiro desafio para ele. E se a senhora Hallmanns estivesse nesse trem? Iria certamente logo reconhecê-lo e ai sim, tudo estaria perdido. Ele teria que ser extremamente cuidadoso.

Em Frankfurt Teuscher havia entrado no trem, totalmente disfarçado. Chapéu na cabeça, cachecol, um casaco comprido de frio, uma pasta de couro em uma das mãos. Por causa do seu disfarce ele foi obrigado a raspar o seu estimado cavanhaque.

Kling também estava disfarçado. Colocou uma barba postiça e bigode. Arrastava uma mala de rodinhas, como que tivesse acabado de descer no aeroporto em Frankfurt chegando de viagem de algum lugar.

Quando Teuscher e Kling deram com o vagão em que Ben se encontrava, Ben pode reconhecê-lo. Tudo encaixava com o que eles haviam combinado na delegacia pouco antes de Ben seguir para o encontro com Steffany na barca.

Ele avidamente com os olhos, fez sinal para Teuscher mostrando onde o grupo estava sentado. Pela aparência Teuscher deduziu serem os australianos. Ao mesmo tempo Ben fez sinal também para o próximo vagão onde possivelmente estaria Georg, Steffany e Klaus com os russos. Teuscher não chegou a vê-los, mas concluiu que era isso o que Ben queria dizer. Ele ainda pôde ver quando Ben levantou as mãos algemadas num bocejo. Com certeza Ben queria mostrar-lhe o quanto ele estaria impossibilitado de fazer qualquer coisa para ajudá-los.

Teuscher e Kling voltaram a seus lugares tentando pensar numa possibilidade de pegá-los. Mas como? Ele teria que dar continuidade ao plano, mesmo que Ben agora não poderia mais fazer a sua parte como eles combinaram. Por todo o trem havia homens da policia espalhados só esperando pelo comando de Teuscher.

Foi nesse exato momento que o acidente do trem se deu.

Teuscher e Kling foram pressionados para a frente e jogados de suas poltronas. O vagão onde eles estavam não havia virado, mas pela pressão que eles sofreram, Teuscher podia pensar no pior.

Sua maior preocupação foi com Benjamin Hallmann que estava no vagão da frente algemado. Teuscher de certa forma se sentia responsável por ele e principalmente pelo pedido que Gabriella lhe havia feito antes que ele partisse para essa missão.

Ele estava exatamente em sua sala conversando com Kling a respeito das dificuldades desse caso.

-Essa gente está nos dando um bocado de trabalho e eu não vejo um final promissor em toda essa história, não. Espero que o que planejamos com o senhor Hallmann dê certo.

-Como assim Chefe? O senhor acha que aquela mulher seria mesmo capaz de matar uma criança? - perguntou Kling.

-Em se tratando deles, não podemos duvidar.

Pouco depois, Teuscher recebeu o telefonema de um dos agentes federais que também estava cuidando do caso.

-Nós conseguimos localizar a barca por onde eles fugiram, inspetor.

-Wunderbar! - exclamou Teuscher. - Maravilha!

-O que foi, chefe? - quis Kling saber. Mas ele fazia sinal com a mão para que ele se calasse. Pois o agente continuava falando ao telefone.

-Deixaram a mulher e a criança amordaçados na barca. Eles estão bem e nós estamos a caminho.

-Ótimo! Finalmente uma ótima notícia.

Quando ele desligou o telefone, ele carinhosamente abraçou Kling. Este por sua vez não entendeu o que estava acontecendo.

-Você me perguntou se aquela mulher seria mesmo capaz de matar aquela criança, não foi? - Kling só balançou a cabeça numa afirmativa. - Agora eu posso te responder. Ela não seria capaz de matar aquela criança. - e então Teuscher lhe contou sobre o que acabara de ouvir.

-Precisamos acionar a polícia costeira e a policia rodoviária. - disse Kling empolgado.

-Isso será impossível Kling, primeiro porque ninguém sabe que estrada eles tomaram e para se chegar à Suíça há muitos caminhos. O mais sensato a fazer é pegarmos um avião que nos leve até Zurique e lá tentar localizá-los através do pessoal que já está em alerta.

-É pra já inspetor.

Com a chegada de Gabriella e Victor à delegacia, Teuscher ficara sabendo das mudanças dos planos de Steffany quanto à transação no dia seguinte.

Por isso ele e Kling não iriam mais até Zurique como eles planejaram com Benjamin Hallmann e sim eles voariam até Frankfurt.

-Por favor inspetor, quero Ben vivo nessa história toda.

-Faremos o possível senhora Kolberg, mas não podemos garantir grandes coisas. O senhor Hallmann sabia dos riscos e mesmo assim decidiu colaborar conosco.

Essa tinha sido a conversa que ele tivera com Gabriella assim que ela e o filho foram libertados por Steffany.

Teuscher e Kling estavam bem e nada sofreram com o baque do trem, mas eles ainda não haviam achado Ben em meio a tantos que iam e vinham retirando os destroços. Teuscher não teve lá grandes esperanças quando viu os dois vagões mais à frente onde ele estava.

Naquela noite, não só fazia muito frio como a neve caía sem parar e isso dificultaria o serviço de ajuda médica e de resgate.

Os trilhos do trem onde estava o vagão número três estavam retorcidos e eles iriam precisar de guinchos para ajudá-los. Os destroços eram impressionantes e dava para arrepiar. Tudo ficou reduzido como uma lata de sardinha.

A ajuda chegou rapidamente e logo grandes holofotes iluminaram o local. As pessoas estavam sendo retiradas lentamente.

Os gritos eram muitos e uma confusão de pedidos de ajuda chegava a cada instante.

Os bombeiros trabalharam toda a noite retirando as vítimas. Já somavam um total de 47 feridos e 10 mortos.

O noticiário naquela madrugada dizia que o maquinista, um recém contratado da rede ferroviária não havia respeitado a sinalização, pois naquele trecho por causa da obra que estava sendo feita ali, ele deveria ter reduzido a velocidade de 120 km para 40 km. E que embora ele estivesse muito machucado, o maquinista sobreviveria ao acidente mas que ele se encontrava em estado grave no hospital em Colônia.

Na verdade, a rede ferroviária não tinha nenhuma ficha do homem que estava dirigindo aquele trem e como a rede ferroviária estava passando por sérios problemas financeiros, ela não queria que isso viesse à tona.

O verdadeiro maquinista que deveria estar dirigindo aquele trem naquela noite estava hospitalizado em uma emergência para uma lavagem estomacal de última hora. Ele havia comigo uma lata de sopa de ervilhas e que possivelmente estaria estragada. Isso era tudo que os responsáveis da rede sabiam.

******

HANS GUNTHER

Gabriella não conseguia dormir, ela esperava que o telefone tocasse a cada momento. Ela assistia ao noticiário e ouviu sobre o acidente do trem, alguma coisa lhe dizia que este deveria ser o trem onde Steffany e Georg faria a transação e que possivelmente Ben estaria nele também.

Ela foi até a janela do apartamento e ficou olhando a neve cair silenciosa lá fora. As ruas, os telhados das casas, as árvores, tudo estava branco. De repente toda a noite havia embranquecido ao menos para ela. Ela tremia tanto de frio como de medo e pavor. Ela sentiu uma dor no peito ao pensar onde Ben poderia estar agora?

Victor e Karin dormiam no quarto, ela estava sozinha com seus medos e aflições. Deixou as lágrimas rolarem face abaixo, ela não precisava segurá-las, e não precisava escondê-las de ninguém.

Também podia se lembrar das últimas palavras de Ben a ela ao se despedir dela e de Victor na barca.

-Cuide bem de você e do nosso filho.

E então ele chamou Steffany.

No começo ela não entendeu o que ele queria dizer com aquelas palavras. Mas quando ela ouviu parte da conversa que ele estava tendo com Steffany e de como ela o beijava. Gabriella entendeu que ele estava novamente disposto a se sacrificar pela liberdade dela e do filho. E agora ele poderia estar morto.

Os repórteres entrevistavam alguns dos sobreviventes que nada sofreram no acidente do trem.

-E o senhor, viu alguma coisa de como o acidente aconteceu? - perguntou o repórter.

-Eu dormia, não vi nada,

-E o senhor?

-Tudo o que sei é que pedi a um homem que nos ajudasse e ele desapareceu na neblina.

-E o senhor aqui, é verdade que o senhor queria comprar tickets para o vagão número "3" e a vendedora no clichê disse-lhe que já estavam esgotadas?

-Sim, é verdade. E dou agora graças a Deus que aquela vendedora falou assim, pois salvou-me a vida.

-Mas na verdade, só havia seis pessoas naquele vagão, o senhor não acha pouca gente para que o vagão estivesse lotado como aquela vendedora falou? O senhor não acha estranho?

-Estranho ou não moço, o fato é que eu estou vivo e todas as pessoas daquele vagão e do outro mais a frente também estão mortas agora - repetia o homem.

O repórter se virou para a câmara que transmitia ao vivo as últimas notícias do local do acidente numa edição extraordinária e completou:

-Parece um caso estranho, mas se trata apenas de mais um acidente como acontecem todos os dias. Chegou agora em minhas mãos a lista dos nomes daqueles que morreram no acidente.

O coração de Gabriella pulsou forte e ela correu para perto da televisão enquanto o repórter continuava.

-O candidato à reeleição Georg Hallmann, sua cunhada Steffany Hallmann, seu irmão Klaus Gühmann, o redator do jornal em Düsseldorf Arthur Kostner, três australianos homens de negócios que estavam sendo procurados pela polícia na Austrália cujo nome foi vedado pela Interpol e outros que a polícia ainda não conseguiu identificar os corpos.

A pergunta que a polícia faz a si mesma é que envolvimento teria o candidato do senado Georg Hallmann com estes australianos envolvidos com a máfia? E será que tudo o que aconteceu aqui não foi um atentado? Mas por quem? Será que o irmão do Ministro, o popularíssimo Benjamin Hallmann, dono do jornal da cidade e dono de várias revistas de sucesso, e que é suspeito no caso da mulher encontrada morta nas margens do rio Reno, também estaria viajando no mesmo trem? Será que ele é um desses corpos que a polícia ainda não identificou? A polícia que está presente no local não quer dar maiores informações sobre este caso bastante sinistro e pouco esclarecido para a população. Aqui fala o repórter Hans Gunther ao vivo de Brühl local do acidente.

Gabriella continuava sem saber se Ben estaria vivo ou não. De repente ela caiu em si.

-Meu Deus! Arthur, não! - ela não podia mais controlar as lágrimas.


******

BEN X GABRIELLA


Kling e Teuscher andavam para lá e para cá procurando entre a multidão um rosto conhecido. Na verdade eles estavam à procura de Ben.

-Você conseguiu achá-lo nas barracas onde estão os feridos, Kling?

-Em lugar nenhum, inspetor.

-Você verificou se eles já fizeram alguma lista com os nomes dos feridos?

-Isso está sendo feito agora. De qualquer forma temos que esperar, inspetor.

Mas Teuscher não queria saber de ficar com os braços cruzados esperando, ele precisava fazer alguma coisa.

De repente a janela de um vagão foi quebrada um homem apareceu pedindo ajuda. Ele não podia enxergar nada sem seus óculos e logo dois homens que pertencia ao grupo de salvamento subiram no vagão tombado e entraram lá para retirá-lo. Ben estava bem, salvo a alguns arranhões e um ferimento em uma das pernas que lhe doía.

Pouco depois, Teuscher e Kling o avistaram na cabana de lona feita pelo grupo Cáritas que estava no local do acidente para ajudar os passageiros levemente feridos. Teuscher ficou feliz em achá-lo vivo. Decididamente ele admirava Benjamin Hallmann.

Ben tentou levantar-se, mas o ferimento na perna não permitiu.

-Inspetor, o senhor já viu alguém do grupo que estava com Steffany? - perguntou Ben preocupado.

Teuscher lhe respondeu que não havia muito o que fazer por eles, pois o vagão onde eles estavam tinha sido o mais afetado e que até agora todos os que se encontravam lá não foram retirados com vida e que ele precisaria mais tarde identificar o que havia restado deles.

-E os australianos que estavam no mesmo vagão com o senhor?

-Eu não os vi. Devo ter ficado inconsciente por alguns momentos porque quando dei por mim eu estava sozinho no vagão.

Teuscher percebeu que não havia muito o que fazer ali.

-Posso levá-lo para casa, senhor Hallmann?

-Eu agradeceria muito, inspetor.

Ben desligava agora a televisão. Um sentimento de vazio e solidão invadia o seu coração. Todos que ele conhecia estavam mortos, inclusive Arthur. Uma sensação de impotência tomou conta dele e começou a chorar, mas ele sabia que esta tinha sido a melhor solução. Pelo que a polícia lhe informara, havia sido realmente um atentado, tudo fora planejado para que saísse assim. Mas por quem? A polícia tinha absoluta certeza de que os vagões número “dois” e “três” tinham sido o alvo.

-Por que você, Arthur? Por quê? Por que você tinha que estar no mesmo vagão com toda aquela raça ruim? - Ben não se conformava.

Ben abraçou Gabriella com força e choraram a dor da perda do verdadeiro amigo que eles tiveram: Arthur Kostner.

-Markus, precisamos entrar em contato com Markus. - falou ela olhando nos olhos Ben.

-Tudo isso é triste demais, logo agora que Arthur descobriu que Markus era seu filho. Ele que sempre desejou ter um filho, que lutou tanto durante toda a sua vida, que perdeu Melanie que perdeu Claire seu grande amor de juventude e que agora nem pôde desfrutar a alegria de ser pai. - As lágrimas rolavam pelo rosto de Ben sem parar.

-Vamos ligar para Markus. - falou Gabriella.

Ben e Gabriella tentaram muitas vezes e dias seguidos. Deixaram recado na secretária eletrônica, deixaram recado na secretária do telefone celular de Markus, mas nenhuma mensagem de volta. Eles se deram conta que não tinham como localizar Markus Krämer.