segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Capítulo 1

- FAMÍLIA -

A rua estava escura e deserta, um homem estacionou um Mercedes azul escuro metálico e olhava agora o relógio. Passava um pouco das três da madrugada. No banco a seu lado no carro, uma outra pessoa segurava uma caixa preta, ele a pegou e a abriu e de lá tirou um controle remoto. Na parte de cima havia um relógio digital que mostrava os números em vermelho. Ele o ajustou para daqui a quatro minutos. Depois, ligou o carro, olhou para seu amigo e sorriu, como que querendo dizer: missão cumprida. Olhou mais uma vez para a casa branca de onde saíram, acenou com a mão direita dando um adeus e apertou o botão vermelho ativando sua contagem regressiva.

A rua composta só de casas era silêncio total. Pisou o pé na embreagem, passou a primeira marcha e partiu.

No velho porão da casa, por todos os lados havia cartuchos de explosivos altamente inflamáveis ligados ao setor elétrico através de uma espoleta. Do tipo que se coloca em edifícios para serem demolidos, com a diferença de que para uma casa não se precisa de tanto material. Fabricação caseira, é claro.

Eles entraram na casa quando viram que há mais de uma hora as luzes não eram acesas. Não tiveram nenhuma dificuldade para entrar no velho porão, a porta já não era tão resistente, pois nada de valor havia ali, a não ser, algumas quinquilharias, coisa de gente velha. Um guarda-roupa de madeira que já se inclinava para o lado, alguns sacos grandes de plástico com roupas que elas não usavam mais e que possivelmente estariam guardando para serem doadas a Cruz Vermelha, uma caixa de papelão com sapatos velhos, uma mala com roupas leves de verão, algumas ferramentas, muita poeira e muita teia de aranha. O porão cheirava a mofo por causa da umidade, pensou um deles.

Deixaram tudo preparado para que ele pudesse acionar o botão e contemplar de longe a beleza do seu trabalho.

Às 3:18h os explosivos detonaram.

******


Era começo de outubro e faltava uma semana para o aniversário de Ben quando o telefone tocou
no apartamento de Gabriella às 5:37 da manhã.

Ela era uma mulher linda, de estatura mediana, cabelos até aos ombros de cor avermelhada, a pele morena clara e ligeiramente bronzeada, olhos amendoados e castanhos. Embora não estivesse enquadrada nos padrões de altura exigidos pela sociedade, podia se dar ao luxo de arrancar suspiros por onde passava.

Ben havia viajado por uma semana para os Estados Unidos para um encontro de diretores que acontece todos os anos. Ele insistira para que ela fosse junto, mas ela disse que não poderia ir, tinha muito para fazer na revista e não dava para tirar férias de uma semana.

- Kolberg. - respondeu ela sonolenta.

-Graziella? - perguntou a pessoa num sotaque italiano o que Gabriella logo percebeu.

- , chi parla, per favore? Gabriella queria saber quem falava ao telefone.

Ela podia sentir as batidas fortes do seu coração, e sentia que algo ruim deveria ter acontecido.

A voz do outro lado do fio explicava que era a vizinha de sua mãe e sua avó e que naquela madrugada havia tido uma explosão na cozinha.

Gabriella pedia a pessoa do outro lado que falasse logo, mas do outro lado a mulher pedia forças a Deus, pois não sabia como dar uma noticia dessa.

-Diga, por favor. - insistia Gabriella e então ouviu a pior noticia da sua vida: Uma explosão de gás de cozinha havia tirado à vida de sua mãe e de sua avó, agora ela estava sozinha neste mundo. A mulher ao telefone lhe dissera que tudo havia sido muito rápido e que ninguém no povoado pôde fazer qualquer coisa.

Desde que seu pai morrera, ela nunca mais havia chorado e agora não conseguia se controlar.

Na mesma hora, ligou para o aeroporto e fez reserva para o próximo vôo que sairia para a Itália. Gabriella não queria se perdoar por não estar perto da mãe nos últimos tempos. Sentiu-se tremendamente egoísta por só querer viver a sua história de amor com Ben.

As pessoas no avião a olhavam sem entender porque ela chorava. A aeromoça chegou a perguntar-lhe se ela sentia alguma coisa, ao que ela respondeu que iria passar.

Não podia acreditar que elas haviam morrido e de que maneira tão brutal. Como elas não perceberam que o gás estava escapando? Como não sentiram o cheiro? Sua mãe ainda estava jovem, era uma mulher esperta, ativa, como não sentiu nada? Amaldiçoou o sistema tão velho de se usar gás de cozinha, por que elas não tinham um elétrico, por que? Ela sabia que não adiantava reclamar agora, isso só era torturar-se ainda mais.

O vôo foi tranqüilo e não houve turbulências e às 14:30 Gabriella pisou na Itália, no aeroporto de Calábria Térmia.

O dia estava lindo, o sol brilhava no céu azul, mas seus olhos não podiam contemplar toda aquela beleza. Seu coração estava triste demais. Por outro lado também não se sentia muito bem, o estômago estava embrulhado, ela não havia comido nada. Sentia-se fraca, sem forças e sozinha.

Se ao menos Ben estivesse aqui... - pensou.

Pegou um táxi e pediu que o motorista a levasse até Monsoreto que ficava a uma distância de uma hora e meia, mais ou menos, do aeroporto. Monsoreto não chega a ser uma cidade, é uma vila situada nas montanhas. Ali as pessoas se conhecem, o peixe é vendido na porta, às mães criam os seus filhos tranqüilamente, os cachorros preguiçosamente se espojam pela estrada, pois nada há para perturbar a sua rotina. Ela custava a crer que tudo isso acontecera ali, naquele fim de mundo.

Gabriella ficou horrorizada com o que viu, a casa estava totalmente destruída, não havia pedra sobre pedra, a impressão que teve é de que um Jumbo caíra sobre a casa.

Hospedou-se numa pequena pensão que ficava a trinta minutos mais ou menos do local do enterro.

Ela agora se recordava de como ficava feliz quando a Nona os visitava no Lago di Garda quando era criança. As duas desciam os campos amarelos dos limoeiros que embelezavam o caminho. Sobre as suas cabeças o céu azul, fazendo contraste com os picos das montanhas com suas pedras gigantescas. Ela não queria recordar os momentos vividos com sua Nona e com sua mãe, mas tudo lhe vinha tão naturalmente à memória. Ela se sentia embriagada pela dor e tudo o que queria era dormir para esquecer o pesadelo que estava vivendo no momento.

-Essa não! Como fui esquecer meu celular em casa!?

Na manha seguinte Gabriella dirigiu-se até uma cabine telefônica e ligou para Arthur.

- Oi Arthur, sou eu Gabriella.

- Menina, onde você se meteu? Ben está louco atrás de você desde ontem.

Então ela começou a contar-lhe o que havia acontecido.

- Sinto muito, Gabriella. Eu vou falar com ele. - Arthur Kostner é o braço direito de Ben no Düdorf Zeitung, o jornal que Ben dirige.

Na hora do enterro as pessoas notaram o quanto Gabriella estava pálida. Desde a notícia da morte da mãe ela mal conseguia dormir. As pessoas comentavam que ela era muito jovem para viver tudo aquilo, mas sem que os pudesse ouvir, pois podiam perceber que tragédia tudo isso estava sendo.

- Amada filha, falou o padre, sua mãe e sua querida avó, estão neste momento nos braços de Deus. Você não gostaria de jogar a primeira pá de terra sobre o caixão?

Gabriella sentiu um calor diferente pelo corpo, viu o céu rodar e as pessoas girarem a sua volta, depois não viu mais nada. Ao voltar a si ela não sabia quanto tempo havia se passado desde então. A sua volta estavam pessoas que ela não conhecia. E isso a deixou mais angustiada. Ela percebeu que um médico lhe tirava a pressão.

- Dove sono? - Onde estou? Quis saber Gabriella.

- Come si sente signora? - perguntou o médico.

-Un intontita. um pouco tonta, ela respondeu.

O médico podia entender perfeitamente que as notícias dos últimos dias a abalaram sobremaneira, por isso receitou-lhe um calmante leve, a fim de que ela pudesse dormir bem e assim recuperar as forças. Ao término da sua consulta, a cumprimentou, com as suas condolências.

Resolveu retornar à Alemanha na manhã de sábado ao invés de segunda-feira como havia previsto. Havia pensado andar um pouco pelas ruas da cidade onde sua mãe e sua Nona viveram os últimos anos. Queria sentir o cheiro da cidade e contemplar as montanhas da região. Olhar o mar que certamente as duas muitas vezes olharam e caminhar por ali. Mas depois de todo esse mal-estar, resolveu ir embora o mais rápido possível.

Se sentia exausta e cansada quando chegou em casa e resolveu tomar uma das pílulas que o médico havia lhe dado, pois tudo o que queria era dormir.

Seus sonhos estavam povoados de fantasmas que a perseguiam e ela acordou com o toque do telefone.

- Oi, meu amor! Como você está? Acabei de chegar e estou te telefonando do aeroporto. Eu sinto muito tudo o que aconteceu, eu sinto também não estar aqui, justamente quando você mais precisou de mim. - era Ben ao telefone.

- Estas coisas não se podem prever. O que mais me dói é que tudo me parece tão estúpido! - falou Gabriella com embargo na voz.

- Eu sei meu bem, agora tudo o que você precisa é ficar calma. Quero que você saiba que eu estou preocupado com você.

-O pior já passou, agora está tudo bem. Só estou muito cansada Ben, acho que foi a viagem, tudo o que me aconteceu. Sinto uma vontade enorme de dormir e tudo o que eu desejo é esquecer este pesadelo. Podemos nos ver amanhã?

- Está certo. Sonhe com os anjos, meu amor.

-Vou tentar.

Na manhã de domingo... Ben a achou pálida, claro que ele podia entender o quanto ela estava sofrendo. Havia fotos da família espalhadas sobre a mesa, alguns objetos pessoais, como um lenço de pescoço colorido, uma caixinha de música com uma bailarina, um camafeu com a figura de uma mulher jovem, e outros objetos. Com certeza presentes dados por sua mãe a ela. Ele sabia que não restava muita coisa para ser feita, mas mesmo assim ele estava a seu lado e ele queria que ela soubesse disso. Ben a levou para almoçar num restaurante pequeno e aconchegante, mas Gabriella pouco tocara na comida e logo quis voltar ao apartamento. Ele podia sentir que ela não estava nada bem.


******
- STEFFANY -


Manhã de segunda-feira na casa dos Hallmanns...

-O jornal da concorrência desta manhã noticiou que o processo contra Georg já dura cerca de dois anos. Acho que desta vez seu irmão está ferrado. O boato que corre é que há provas bastante comprometedoras. E aquela idiota da mulher dele acredita em tudo o que ele diz. Como pode existir pessoas assim?

-E o que você tem com isso?

- Eu não tenho nada e nem quero ter. Tudo o que eu quero é que esse processo vire um escândalo e que essa moça prove o quanto ele é um mulherengo, traidor, corrupto e que desvia dinheiro do estado. Eu quero mais é que ele se enrole até o pescoço com todos esses boatos e provem que ele não tem condições de se candidatar nem a Ministro, nem a Prefeito e nem a coisa alguma, nem aqui e nem em lugar algum. - Comentou Stefanny com Ben no café da manhã.

-Você nunca o perdoou por ele ter te trocado pela Karin, não é mesmo? Você ficou arrasada com o fora que ele te deu. - falou ele com desprezo.

- E você que me implorou para que eu me casasse com você para que a sociedade se calasse diante daquele escândalo que você se envolveu, já se esqueceu? Pois, é meu querido, desde o momento em que aceitei essa farsa pra te livrar, nada mais me arrasa como pessoa. E fique você sabendo, que se realmente eu quisesse, teria me casado com Georg ou com um outro qualquer melhor que você.

Steffany vomitara as palavras no rosto de Ben.

- Você sabe muito bem que não foi nada disso. E que eu nao sou nada disso.

- Eu é que não sou meu bem, porque já nasci mulher. Enquanto que você até hoje não consegue explicar o que aconteceu naquela noite. Tudo o que é capaz de se lembrar é que me implorou para te tirar daquela merda em que você se enfiou e que estava fedendo até as suas narinas.

-A história também não foi assim... As coisas não estavam tão boas para você não. Você e sua família não tinham onde caírem mortos, viviam só de nome e eu cheguei com uma boa solução para todos vocês: Dinheiro, minha cara. Eu era exatamente a solução rica e financeira para o jogador e perdedor que o seu pai era, para as consumidoras que você e sua mãe eram e são até hoje. Pelo que eu sei e todos nós sabemos, você era a cadela suja da sociedade.

-O que isso foi bastante cômodo e convincente para que você se casasse exatamente com essa cadela suja, pois todos sabiam que na minha cama só homens me visitavam. - falou ela pegando a garrafa de whisky e depositando o líquido no copo e continuou. - Foi muito fácil, depois que te encontraram na cama com aquela bichinha amarela do Richard, você correr para mim e eu dizer que não poderia ser verdade porque estávamos de casamento marcado e que esperava um filho teu. Um filho que nunca nasceu, para a minha felicidade. - Fez uma pausa para tomar um gole da bebida. - E agora vê se me deixa em paz, não meta o seu nariz na minha vida, isto está no nosso contrato de casamento. Não se esqueça, todo silêncio tem o seu preço - ameaçou ela.

Geralmente era assim que terminavam as conversas entre Ben e Steffany. Ele já não media mais suas palavras e não queria mais ter paciência com ela. Ele queria o divórcio. Custasse o que custasse, ele iria consegui-lo. Ele sabia que estava preso nas garras dela. De alguma maneira ela havia conseguido as fotos e negativos daquela noite fatídica para ele. Com isso ela o ameaçava. Vivia dizendo que iria tornar público o seu passado. - Mulheres eram assim mesmo. - pensava Ben. - Não, Steffi era assim. - consertou. - Ele sabia que jamais poderia confiar nela. Às vezes pensava se não teria sido melhor ter enfrentado o escândalo daquela época, pois com o tempo tudo cairia no esquecimento e assim ele teria tido a chance de se apaixonar por uma mulher de verdade, de ter filhos, de ter realmente uma família e ser feliz. Para ele a felicidade se chamava Gabriella.

******

- GABRIELLA -

Ainda manhã de segunda-feira...

Um homem subia às escadas do prédio onde Gabriella mora, quando de repente ele a amparou nos braços e a conduziu para o apartamento. Ele a aconselhou que telefonasse ao seu médico. O homem lhe disse que ficasse na cama até que ele chegasse. Ela se lembrou que deveria ligar para o trabalho, diria que não poderia ir e que esperava pelo médico. Quase meia hora depois o médico chegou.

- O que temos aqui? - perguntou o médico querendo descontraí-la.

- Não sei doutor, acho que vou pegar um resfriado e desses bem fortes.

- Quais são os seus sintomas?

- Vejo o mundo girar à minha volta, é uma sensação horrível de morte. – exagerou.

-Ponha a língua pra fora, por favor. - ela se sentiu como criança fazendo isso.

O médico agora lhe verificava o pulso, seus olhos, verificou a temperatura e fez anotações.

- Como tem se alimentado?

-Pessimamente, não sinto apetite e só de pensar em comida me embrulha o estômago.

- Sei.

- O que é que eu tenho doutor?

-Pode ser muitas coisas, senhorita. Você nos últimos dias tem trabalhado demais?

-Pra ser sincera, nem tanto.

- Sofreu alguma emoção muito forte?

- Sim, perdi minha mãe e minha avó há poucos dias.

-Sinto muito. Creio que o seu sistema emocional está muito abalado. Se você estiver se sentindo bem, amanhã passe no meu consultório; vamos fazer um exame de sangue e um check up.

- Está certo doutor, obrigada.

-Até amanhã, senhorita.

Mal o médico havia ido embora, a campainha tocara. Gabriella pensou que fosse Ben e se abriu em sorrisos para recebê-lo, mas para sua surpresa era o homem que a havia amparado nas escadas.

-Desculpe-me a intromissão, mas é que fiquei preocupado com o seu estado.

- Eu é que lhe agradeço, por favor entre.

-Markus Krämer, sou inglês, apesar do nome alemão. - se apresentou.-

- E eu Gabriella Kolberg, sou italiana, apesar do nome alemão.

Os dois acharam graça da coincidência. O homem contou que seu pai, que era alemão se casou com sua mãe que era americana e que morava na França, e que mais tarde eles foram viver na Inglaterra e lá ele nascera.

Gabriella por sua vez contou que seu pai era alemão e conheceu sua mãe que era italiana quando estava em férias.

-Meu pai ficou tão apaixonado, que nunca mais saiu da Itália.

- Ficou apaixonado por quem? Pela Itália ou pelas italianas?

-Pelas duas, creio eu.

Parecia que já se conheciam há um bom tempo, mas Gabriella se sentia um pouco embaraçada pela presença dele ali. Markus percebeu, e começou a falar algo para quebrar o gelo:

-Você tem um belo apartamento.

- Obrigada. Ainda nem agradeci por ajudar-me esta manhã. Muito obrigada. Você mora no prédio? Eu ainda não o vi por aqui.

- Não, eu não moro no prédio. Eu estou à procura de um amigo de meu pai. Ele perdeu o contato já há algum tempo e como eu estou visitando a Alemanha, queria ver se o encontrava.

- Não o encontrou?

-Não, acho que ele não mora mais aqui.

-Você já tentou a lista telefônica, procure pelo sobrenome.

- É isso o que eu vou fazer assim que chegar no hotel.

- Aceita um café?

A noite veio e com ela trouxe Ben. Ele era um homem alto, com os cabelos muito lisos e num louro escuro, tinha os olhos azuis e a pele branca lhe fazia um contraste pálido. Usa óculos e sem eles, não poderia enxergar nada a sua frente. Gabriella está apaixonada e para ela, ele é o homem mais lindo do mundo. Ben é diferente de todos os homens que ela já havia conhecido. É meigo, carinhoso, atencioso e tudo o que ela sabia sobre o seu trabalho na redação da revista para a qual ela era responsável no momento, ela devia a ele. Já não trabalhavam mais juntos, pois ela há um ano atrás havia decidido deixá-lo. Mas o destino não quis assim e os aproximou novamente. Ele a achou realmente muito abatida. A dor da perda havia sido demais para ela, pensava ele.

-Vou amanhã com você ao médico.

-Ben, isso não, eu posso ir sozinha. Fora disso você precisa estar no jornal.

-Ao menos deixe-me levá-la.

-Está certo, mas só levar-me. - Como era bom estar novamente nos braços fortes dele, era quando se sentia realmente protegida. Que bom que ele existia em sua vida. Essa foi a primeira noite desde então que ela conseguia dormir sem ter aqueles pesadelos onde a morte vinha com um sorriso e depois lhe apresentava a foice e cortava-lhe o pescoço.

Na manhã seguinte quando Gabriella estava saindo do consultório médico sentiu-se tonta novamente. Reclamou consigo mesma porque dispensara a companhia de Ben, agora ela tinha que pegar um táxi. Ela chegou em casa por volta das 11 horas, sentia-se melhor. Como tinha muito o que fazer, resolveu trabalhar de casa, pois há dias não ia à redação da revista.

Já passavam das 13:30 quando o telefone tocou.

-Desculpe-me se tomei a liberdade de telefonar-lhe, mas eu gostaria de saber como foi esta manhã lá no médico? - era markus Krämer.

-Foi tudo bem.

-E agora, como você se sente?

- Estou ótima, é estranho, o mal-estar é somente pela manhã, depois me sinto ótima, estou até trabalhando de casa.

- E você já almoçou?

- Pra dizer a verdade ainda não, porque nunca sinto fome.

- Isso não é bom. Se você não come, aí sim é que pode ficar gravemente doente. Eu não conheço muito bem a cidade mas ontem jantei num italiano e me lembrei que você havia me dito ser italiana. E como toda italiana gosta de uma boa pasta, passo em trinta minutos para pegá-la e não me deixe esperando porque passarei de táxi.

Gabriella nem teve tempo de recusar, ele já havia desligado o telefone. E como ele tinha o número dela? Ela nao se lembrava de tê-lo dado.

Enquanto se arrumava ela pensava que coisa engraçada era tudo aquilo, pois ele nem a conhecia direito e mesmo assim por duas vezes demonstrava certa preocupação pelo seu estado de saúde.- Esses ingleses, são mesmo muito educados. - pensou ela.

Markus tinha razão, o restaurante fazia mesmo uma pasta italiana deliciosa. O ambiente também cheirava à Itália, podia-se dizer. Garrafas de vinhos decoravam o ambiente todo em madeira com quadros da bela Nápole. Ela nem percebeu que havia comido tudo, se sentia faminta e nada restou no prato. Ela estava surpresa consigo mesma.

- Acho que você tem a culpa de me fazer comer tanto.

- Fico contente que tenha gostado.

Markus dera um sorriso tão lindo. Foi quando ela percebeu que homem bonito, gentil e charmoso ele era. Cabelos e olhos castanhos claros, com certeza ele os trazia da sua mãe. Filhos homens sempre puxam o lado da mãe, dizia sua Nona. Ele era um homem atraente, alto, não muito magro um estilo atlético, ele deveria praticar algum tipo de esporte pensou ela. E que olhos vivos e brilhantes ele tinha. Se ela não fosse tão apaixonada por Ben, com certeza ele seria um forte candidato. Sentiu que seu rosto queimava e sabia que mais uma vez ela havia ficado vermelha com os seus pensamentos. Para disfarçar ergueu um brinde.

-Faço um brinde a sua visita à Alemanha!

-E eu faço um brinde à comida italiana!

Na verdade o que Markus queria dizer é que fazia um brinde a ela.

Ele havia ficado encantado por sua beleza assim que a viu pelo retrato quando Arthur Kostner lhe disse que essa era a sua missão: Que ele deveria de qualquer maneira entrar na vida dela e que ele usasse todo o seu charme para isso.

Arthur teve que escolher a dedo, pois conhecendo Gabriella como ele a conhecia, ele sabia que não seria fácil para essa pessoa conquistar a sua confiança.

Mas parece que a sorte estava do lado dele. Ele não sabia que ela havia regressado da Itália, pois o seu vôo de volta à Alemanha estava marcado para segunda-feira. E sendo assim, naquela manhã ele teria tempo de verificar as dependências do prédio onde ela mora para conhecer a área.

Para sua surpresa, ela quase desmaiara em seus braços na escada o que ele gostou muito. Mas por outro lado ele estava preocupado em saber realmente o que ela tinha.

Ele estava como que embriagado pela voz dela, por seu sorriso, por tudo que ela fazia. Desde que ele a conhecera era a primeira vez que a via sorrir, e como ela tinha um sorriso lindo. Pessoalmente ela é muito mais bonita. - pensava ele.

Quarta-feira...

Gabriella resolveu que voltaria a trabalhar.

Sem que ela percebesse, alguém he vigiava cada passo: Markus Krämer. Ele a observou quando ela na tarde daquele dia comprara um lindo cachecol verde escuro de cashimira rajado em preto de muito bom gosto por sinal.

Ela andava pelas ruas da cidade absorvida pelos próprios pensamentos.

-Será que Ben vai gostar do cachecol? E da cor? Não sei, não, é tão complicado comprar presentes para homens. Principalmente para um homem como Ben, tão fino, tão elegante, que já tem tudo. Que presente se dá para um homem que faz 35 anos? Será que eu não deveria ter-lhe comprado um perfume de marca, também?

Gabriella detestava esse tipo de coisa: não saber o que presentear. Ela estava presa a esses pensamentos quando sentiu uma vontade irresistível de comer pepinos em conserva. Resolveu entrar num supermercado para comprar um vidro. Ao experimentá-los sentiu o sabor azedo e arrepiou-se. Mas achou tudo delicioso demais.

Quinta-feira à tarde...

Alguém do consultório médico ligou para ela e pediu-lhe que fosse até lá. Gabriella pensou mil coisas com esse telefonema. Sentiu novamente tudo girar a sua volta, um calor invadiu seu corpo e ela se sentiu sufocada.

- Será que estou com algum câncer? - este foi o seu primeiro pensamento. - Porque o médico não poderia me dizer pelo telefone? Dio mio, será que o meu caso é assim tão grave que ele preferiu me dar a notícia pessoalmente?

- Sentiu vontade de chorar, só de pensar que ela poderia perder Ben. Ao chegar ao consultório...

-Como está se sentindo, senhorita Kolberg?

- Pra ser sincera, muito bem, e já até comecei a trabalhar. - ela tentava disfarçar o seu nervosismo.

- Ótimo! Os resultados dos exames já chegaram.

- E o que é que eu tenho, doutor? - Gabriella já não podia mais se controlar.

-Meus parabéns! A senhorita vai ter um filho!

Gabriella se sentiu nas nuvens, e se não estivesse sentada, possivelmente teria caído no chão.

- Como é doutor?

- A senhorita vai ser mãe.

- O senhor tem absoluta certeza do que está me dizendo?

- Em tantos anos de profissão, essas coisas não se erram mais. E depois, com toda essa tecnologia de hoje é praticamente impossível um laudo desses estar errado, senhorita Kolberg.

-Mas isso é maravilhoso, doutor!

-Acredito que sim.

- O que devo fazer, doutor? Eu nunca estive grávida antes. - O médico experiente podia ver isso no rosto dela.

- A senhorita deve procurar o seu ginecologista o quanto antes, ele lhe dará todas as informações necessárias e todos os cuidados que a senhorita deve ter com a alimentação para que o bebê se desenvolva forte e sadio. E também, ele deve receitar algum medicamento para ajudar com os enjôos.

Gabriella estava nas nuvens. Ia ter um filho de Ben. Ela caminhava pela calçada sorrindo para todas as pessoas, passou a observar melhor as mães que com os seus carrinhos de bebês passeavam pelas ruas da cidade. Todo o mundo a sua volta ficou de um colorido que ela jamais vira. Num grande impulso, ela entrou em uma loja de roupas para bebês, teve a vontade de comprar um sapatinho para o filho que estava esperando.

- Gostaria de ver sapatinhos de bebês, por favor. - disse ela à vendedora.

Que lhe trouxe meia dúzia de sapatinhos. Gabriella se deliciava, observando como eram tão pequeninos. Ela fazia a comparação lembrando-se de como Ben tem pés grandes, afinal ele é um homem de 1,92 m. Com certeza o seu filho também seria tão alto quanto o pai. Ela sorria por todos os cantos da boca, numa felicidade que ela não conseguia frear.

- Vou ficar com este daqui, amarelinho, com acabamento em branco.

Gabriella foi agora para o estacionamento pegar o carro, mas tinha vontade de andar os vinte quilômetros a pé até a sua casa. Queria contemplar a beleza desse dia.

Envolvida em seus pensamentos ela teve uma idéia maravilhosa, não diria nada a Ben até à noite do aniversário onde ela junto ao cachecol entregaria também os sapatinhos que havia acabado de comprar. Ela sorria só de imaginar a cara boba que ele faria e perguntaria a ela:

- Acho que para os meus pés precisam de um número maior. - E então lhe diria sorrindo, que os sapatos não eram para ele e sim para o filho dele que ela estava esperando.

Guardaria segredo até a noite de sábado e então lhe daria esta bela notícia. Isso sim, é que é presente de aniversário, pensava.

Primeiro Steffany concordara com o divórcio e agora ela recebia a notícia do bebê.

Gabriella estava muito feliz. Evitou pensar em sua mãe, pois ela não queria que as tristezas da vida chegassem agora para deixá-la triste. Mas certamente que sua mãe seria uma Nona maravilhosa, isso seria.