segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Capítulo 14

- GABRIELLA -

Os gritos dentro do avião eram agonizantes à medida que ele em seu percurso se aproximava cada vez mais do mar.

A mente da gente é fantástica pensava Gabriella, como ela consegue transformar toda uma vida em apenas alguns segundos ? E como é que pode toda uma vida pelo qual a gente luta tanto para sobreviver, nesses momentos nada valem, tudo o que você fez se resume em apenas flashes. É como estar vendo um filme em uma rotação muito rápida. É como estar dentro de um pesadelo do qual você não sabe como acordar para sair dele. Mas no fundo no fundo, você sabe que tudo o que está vivendo ali não passa de um sonho mal e quando você acordar tudo estará acabado.

Mas estar dentro de um avião onde os motores não funcionam mais, você tem absoluta certeza de que não há como escapar e tudo o que você pode fazer agora é ao menos procurar manter-se calma para receber a morte de modo tranqüilo.

Por outro lado vem um sentimento de inutilidade, pois ainda tinha tanto para fazer.

- Logo agora que pensei em começar a viver novamente, ela me apresenta a morte.

O choque com que o avião entrou na água foi grande. O nariz do avião mergulhou na direção do fundo do mar e tudo começou a ficar nublado.

Com o encontro dele com as águas houve um baque surdo como se fosse uma explosão. O avião quicou com forca várias vezes no fundo do mar.

Parecia que tudo estava se partindo em mil pedaços, inclusive ela.

A velocidade do avião era ainda muito grande e o barulho dentro dele era de dar pavor. A lataria fazia um barulho ensurdecedor, ela tinha a impressão que sua cabeça estava dentro de uma panela e alguém do lado de fora batia sem parar.

Seu corpo sofreu um impacto tão grande que tudo empinou para trás junto com a poltrona. Do pescoço para baixo ela não conseguiu mais mover-se, apenas as pernas tremiam alucinadamente fora de controle. O rosto ficou estático com a pressão que fazia ali do lado de dentro e mesmo que ela quisesse abrir ou fechar a boca, abrir ou fechar os olhos ela não conseguia. As malas de mão, começaram a cair sobre as pessoas, pois as portas dos compartimentos onde elas estavam se abriram com o impacto.

Gabriella ainda ouviu mais um barulho surdo e a traseira do avião tocou o chão. Ele ainda estava sendo arrastado, agora com menos velocidade. Por alguns instantes ela se sentiu flutuar, mas na verdade ela estava afundando dentro dessa lata gigante. Muitas poltronas tinham sido arrancadas dos seus lugares, inclusive a dela, a água chegou levando tudo que encontrou pelo caminho numa velocidade vertiginosa.

Não havia nada que se podia fazer. A não esperar a morte chegar.

-A água aqui embaixo está fria demais. - pensou ela.

As pessoas estavam sendo tragadas e arrastadas. A poltrona de Gabriella flutuava, ela abriu a fivela do cinto de segurança que a prendia e tentou chegar ao teto do avião em busca de ar. Mas ele já estava todo tomado pelas águas. As máscaras de oxigênio de nada serviam.

-Meu corpo nunca será encontrado para ser enterrado. - pensou ela assim num último instante. - vou virar comida de peixe, ou será que alguma sereia vai aparecer para me buscar?

De repente ela sentiu alguém segurando-a pelos cabelos. Ela se debateu tentando desvencilhar-se. Quanto mais ela se debatia mais a pessoa a segurava e a puxava com uma força descomunal.

-Alguém está morrendo. - pensou ela.

Gabriella sentia agora as águas entrando pelas suas narinas e o sal cortando-lhe os pulmões e tudo por dentro queimar.

Ela tentava buscar ainda um resquício de ar que os seus pulmões pudessem ter. Mas tudo o que ela sentia era a água salgada que entrava pela garganta a dentro. É simplesmente horrível. - pensou.

Aquela mão estranha estava presa aos seus cabelos, e a puxava para uma direção que ela não conseguia mais definir se era para cima ou para baixo.

Ela lutava para desvencilhar-se, mas seu esforço era em vão. Suas mãos agora tentavam agarrar as mãos da pessoa que segurava seus cabelos, ela queria forçá-lo a deixá-la, mas era em vão. A mão forte a puxava cada vez mais com força, seu corpo se debatia querendo desvencilhar-se. Tudo o que ela queria naquele momento era morrer em paz.

Seus pés tocaram em algum objeto enquanto ela lutava. Era um objeto grande, macio e pesado, deve ser uma poltrona, ela pensou. Mas era o corpo de um homem gordo.

As mãos tinham tanta força. Ela podia sentir como as raízes dos seus cabelos agora lhe doíam. Se eu pudesse falar com essa pessoa, eu pediria que me deixasse morrer em paz.

De repente ela pensou em Ben como num último adeus.

-Oh, Ben? Por que não foi possível entre nós? Meu filho, daqui a pouco nós vamos nos encontrar e estaremos juntos para sempre.

Ela abriu os olhos querendo ver alguma coisa ou mesmo querendo ver pela última vez o mundo que estava deixando. Ela tentava contar os minutos já sem ar, somente mais três minutos? Talvez menos que isso, para tudo acabar de vez.

Foi quando ela viu uma claridade que vinha de cima, ela achou que estava chegando no céu. Ao menos tinha sido tão rápido que ela nem sequer percebera quando realmente morrera.

-Não sabia que era tão fácil e tão rápido morrer. - pensou.

Mas tudo parecia ainda tão real. Ela podia sentir as narinas queimarem e um gosto quase amargo na garganta. Ela já não tinha mais ar, as forças já lhe abandonavam.

Restam-me ainda menos de dois minutos até que meu cérebro morra. Ela sentia ainda o movimento das águas na pele, agora de uma forma bem suave, quente.

Foi aí que ela viu a pequena e fraca claridade do sol através das águas e compreendeu que a mão forte dessa pessoa estava desesperadamente tentando salvá-la. Ele a puxava para cima nadando apenas com os pés e uma das mão.

Gabriella num último esforço começou a movimentar também os pés e as mãos para ajudá-lo, mas ela estava lenta. Seu cérebro precisava urgente de oxigênio. Agora ela sabia o que estava acontecendo e não iria lutar contra a pessoa que a estava salvando. Ela ainda não havia morrido! Ela não iria virar comida de peixe. A vida estava lhe dando uma nova oportunidade e ela iria agarrá-la de unhas e dentes e assim ela perdeu os sentidos.